04 maio, 2010





A chamada no meio da noite



Todos sabemos o que é um daqueles telefonemas no meio da noite. E naquela noite não foi diferente.Acordada de repente com o barulho, olhei para os números brilhantes do meu relógio. Pensamentos de pânico me ocorreram ao pegar o telefone estremunhada. "Está?" Meu coração disparou, apertei o telefone ao ouvido e olhei para meu marido, que agora se virava na cama. "Mãe?" mal conseguia escutar o sussurro . Mas imediatamente pensei na minha filha. Quando o som de uma jovem chorando desesperadamente se tornou claro através da linha, chamei o meu marido e apertei o seu pulso. "Mãe, sei que já é tarde. Mas não... não diga nada até eu terminar. E antes que me pergunte, andei a beber sim. Quase me despistei alguns quilómetros atrás e..."Comecei a respirar rápido e breve, soltei meu marido e coloquei a mão na testa. O sono ainda entorpecia a minha mente, e tentei lutar contra o pânico. Algo não estava bem. "Fiquei com tanto medo. Eu só conseguia pensar na dor que seria se um policia aparecesse na sua porta para dizer que eu estava morta. Quero... voltar para casa. Sei que fugir não foi certo. Sei que você está muito preocupada. Deveria ter ligado há alguns dias, mas estava com medo... medo..." Soluços de emoção profunda passaram pelo telefone e foram direto ao meu coração. Imediatamente imaginei o rosto da minha filha e minha mente turvada começou a clarear. "Acho...""Não! Por favor, me deixe terminar! Por favor!" implorou ela, não com raiva, mas cheia de desespero. Fiz uma pausa e tentei imaginar o que dizer. Antes que eu pudesse começar, ela continuou. "Estou grávida, mãe. Sei que não deveria beber .especialmente estando assim, mas estou com medo, mãe. Com muito medo!" A voz pausou novamente e mordi meus lábios, sentindo meus próprios olhos se encherem d'água. Olhei para o meu marido que dizia, "Quem é?" Sacudi a cabeça e como não pude responder, ele saltou da cama e saiu do quarto, voltando poucos segundos depois com o telefone móvel no ouvido. Ela deve ter ouvido o clique na linha porque continuou: "Você ainda está me ouvindo? Por favor, não desligue. Preciso de você. Eu me sinto tão sozinha." Apertei o telefone e olhei para o meu marido, pedindo sua orientação. "Estou aqui, eu não desligaria," disse eu. "Eu devia ter lhe contado, mãe. Sei que devia ter lhe contado. Mas quando conversamos, você não pára de me dizer o que fazer. Você lê todos esses panfletos sobre como conversar sobre sexo e coisas assim, mas só você fala. Você não me escuta. Nunca me deixa falar e dizer como me sinto. É como se meus sentimentos não fossem importantes. Você acha que sabe todas as respostas só porque é minha mãe. Mas às vezes eu não preciso de respostas. Só quero alguém que me escute." Engoli em seco o nó que tinha preso à garganta e olhei para os panfletos sobre como conversar com as crianças. "Estou escutando", sussurrei. "Sabe, lá atrás na estrada, depois que perdi o controle do carro, comecei a pensar no bébé e em cuidar dele. Então vi esta cabine telefónica e foi como se estivesse a ouvi-la pregando sobre como as pessoas não devem beber e conduzir. Então chamei um táxi. Quero ir para casa." "Que bom, querida", disse eu, sentindo uma enorme sensação de alívio no peito. Meu marido chegou mais perto, sentou-se ao meu lado e entrelaçou seus dedos nos meus. "Mas sabe, acho que posso conduzir agora." "Não!" disse eu bruscamente. Meus músculos se enrijeceram, apertei a mão do meu marido. "Por favor, espere o táxi. Não desligue até o táxi chegar aí." "Eu só quero ir para casa, mãe." "Eu sei. Mas faça isso pela sua mãe. Espere o táxi, por favor." Escutei o silêncio temerosa. Como não ouvi a resposta, mordi meus lábios e fechei os olhos. De alguma forma eu tinha que impedi-la de conduzir. "O táxi está a chegar agora." Só quando eu ouvi alguém ao fundo perguntando se foi dali que pediram um táxi é que senti a tensão passar. "Estou indo para casa, mãe." Clique e o telefone emudeceu. Saindo da cama, com lágrimas nos olhos, fui até o corredor e fiquei parada no quarto da minha filha de 16 anos. O silêncio era pesado. Meu marido veio atrás, colocou seus braços ao meu redor e apoiou seu queixo no topo da minha cabeça. Enxuguei as lágrimas do meu rosto. "Temos que aprender a escutar",disse-lhe eu Ele me virou para que eu olhasse em seus olhos. "Vamos aprender. Vais ver." Ele então me tomou em seus braços e enterrei a cabeça em seus ombros largos.Deixei que ele me abraçasse por um bom tempo, então virei-me e voltei a olhar para a cama. Ele me observou por um segundo e então perguntou, "Será que ela algum dia vai saber que marcou o número errado?"Olhei para a nossa filha dormindo na sua cama e depois voltei a olhar para ele. "Talvez não tenha sido o número errado afinal de contas.""Mãe, pai, o que estão fazendo?" a voz abafada da jovem saiu de debaixo dos cobertores.Fui de encontro à minha filha, que estava agora sentada olhando no meio da escuridão. "Estamos praticando", respondi eu."Praticando o quê?" disse ela voltando a deitar-se, com os olhos já fechados de sono.




"A Escutar"……………… sussurrei passando a mão em seu rosto.