29 maio, 2010

Com Interesse


SANTUÁRIO DE FÁTIMA TEMA DO ANO 2010:
"Reparte com alegria,
como a Jacinta"

Pobreza e riqueza são temas recorrentes da comunicação social: na literatura, no cinema ou na informação dos períodos do Natal, do Verão, das épocas de lazer.
A literatura cor de rosa recorre ao mundo do sonho, onde milionários em grandes mansões e rodeados de luxo parecem os mais felizes, ou então, nos lugares mais paradisíacos, já não parecem criaturas deste mundo, mas semi-deuses inundados de felicidade.
Na literatura de viagens e nos documentários publicitários, a pobreza é espectáculo. Na Índia superpovoada, na selva sul-americana, no continente africano ou nas ruas escuras das metrópoles ocidentais onde as pequenas bolsas de miséria tendem a aumentar, há bons cenários para a fotografia artística, para as cores dramáticas ou para o refinado a preto e branco.
Os objectivos são variados, mas denotam uma relativização do essencial do ser humano; as abordagens desviam o olhar daquilo que ele é para aquilo que ele tem. Se o homem tem uma vida económica segundo os padrões da normalidade, passa despercebido; se é extremamente rico ou pobre – supermilionário ou miserável - tem tratamento noticioso.
Tornou-se lugar-comum a pergunta acerca das razões da pobreza e da miséria de uma parte significativa dos habitantes do planeta. Se há recursos para a humanidade inteira, por que razão se morre de fome? Será um problema de carácter administrativo ou uma incapacidade logística de organização para uma adequada distribuição? Será que a mesma humanidade que conseguiu progredir nas tecnologias e nas ciências, que debelou tantas doenças antes incuráveis, conquistou o espaço, explicou muitos mistérios da vida, não é capaz de levar uns camiões de arroz às zonas de fome? E, no que toca à pobreza espiritual, à solidão e abandono, indiferença e maus tratos? Não haverá solução no coração de uma humanidade dotada de consciência e razão?
Crescemos, mas ficámos crianças em humanidade; aumentou o cérebro, mas o coração ficou pequeno; construímos cidades, mas excluímos alguns para as selvas e as ruas sem-abrigo; criámos pão em abundância que mata uns de fartura e outros de fome; admitimos uns ao convívio feliz das nossas relações e deixamos outros às portas da solidão.
Entre os muitos problemas que afectam a humanidade, o da justiça e equidade na distribuição dos bens da terra, juntamente com o da partilha dos recursos espirituais, são, sem dúvida, dos mais importantes, que não se resolvem com leis adequadas, mesmo que elas sejam de suma importância. A outra parte está em cada pessoa, no modo como se encaram os bens, a vida e os outros; está no coração onde se jogam sentimentos e atitudes variadas, que vão do egoísmo e do ódio à dádiva e ao amor.
O Santuário de Fátima pretende, este ano de 2010, dar um contributo a todos os que se pretendem pôr a caminho na mudança cultural que se impõe. “Reparte com alegria, como a Jacinta” é a frase-chave, que encerra uma proposta de reflexão, oração, celebração e catequese a partir do décimo mandamento do Decálogo e do testemunho da Beata Jacinta Marto.
No mandamento que ordena “não cobiçar as coisas alheias” temos um sinal da pedagogia de Deus, que situa no interior do ser humano a origem de todos as tentações e males que nos afectam. O respeito pelos outros e por aquilo a que têm direito é regra de ouro da sã convivência, é preceito elementar da justiça. A mensagem cristã, no testemunho e nas palavras de Jesus quis explicitar este mandamento com as referências ao amor e à caridade até ao sacrifício de si mesmo.
Na vida da beata Jacinta Marto temos um dos mais belos exemplos de generosidade, amor e partilha. Jacinta vai ao essencial, pois partilha o que tem, mesmo que insignificante no seu valor material, e partilha o que é, num dom total de si mesma a Deus e ao próximo. É uma vida tocante pela sua autenticidade e mais ainda por provir de uma criança, tão pequena na idade e tão grande nos sentimentos. Belo testemunho a arrastar-nos para a cultura da vida como dom.
P. Virgílio Antunes, reitor do Santuário de Fátima(editorial da "Voz da Fátima" de 13 de Janeiro de 2010)