13 junho, 2009

Para Meditar


Escuta, filhinho.

Esta noite, vendo-te adormecer com a mãozinha no rosto e os cachos espalhados pela fronte, sinto-me horrivelmente envergonhado. Por isso é que fugi para o teu quarto, para estarmos sozinhos, os dois... Ainda há pouco eu estava a ler o jornal na sala, quando de repente me senti sacudido por uma espécie de remorso, e vim, como um criminoso, para aqui, perto da tua cama. Sabes o que pensava, meu bem? Em todas essas coisas que hoje me irritaram tanto. Esta manhã, quando tu te preparavas para a escola, eu te repreendi severamente porque tu lavaras o rosto como um gato. Depois, eu te pus de joelhos porque não tinhas engraxado os sapatos. E fiz um escândalo porque derrubas-te no chão qualquer coisa... Na hora do almoço, ainda encontrei alguma coisa para te censurar: "Tu vais entornar o copo de leite... Não ponhas os cotovelos na mesa... Estás a por muita manteiga no pão..." Pouco depois, quando eu entrava no carro, tu, da porta, abanas-te a mãozinha, dizendo: "Até logo, pai!" E eu soube dizer-te: "Fica com os ombros direito. assim acabas corcunda!" E a coisa continuou. Pois de tarde, vendo-te jogar bola com os companheiros no pátio, olhei os teus joelhos: Tu tinhas rasgado as calças! Aproveitei a oportunidade para te humilhar diante dos amiguinhos, ordenando-te que fosses andando na minha frente, para casa.”“ Roupa custa caro... Se tivesses de pagá-las, terias mais cuidado...”Imagina, meu bem, da parte de um pai, que lógica mais estúpida. E esta noite ( lembras-te?), enquanto eu estava lendo, apareces-te, timidamente, na porta da sala, com uma carinha triste... Eu levantei os olhos do jornal, aborrecido por me interromperem. Tu hesitas-te um instante.” O que é que ainda queres comigo?”Resmunguei. Tu respondes-te:” Nada, pai!”E então te atiras-te para meu colo, e passas-te os bracinhos em torno do meu pescoço, e me beijas-te uma, duas, três vezes... não sei mais... com um amor que só Deus te podia ter posto no coração, e que só teu coraçãozinho seria capaz de o fazer com tamanha ternura. E logo te foste, escada acima. Pois bem, meu filho, só alguns minutos mais tarde foi que o jornal me caiu das mãos, e senti aquele arrepio no coração, e tomei consciência do meu terrível egoísmo. Que foi que o hábito fez de mim? O mau hábito de queixar-me, de reclamar, de repreender, e tudo isso porque tu és apenas uma criança! No entanto, não era por falta de amor; mas porque eu esperava demais da tua idade! Eu te media com a escala da minha, e estou bem triste comigo, podes crer.
Eu te prometo que, a partir de amanhã, nem minha impaciência, nem meu nervosismo, nem meus aborrecimentos, virão mudar todo o amor que eu te tenho.


Perdão, filhinho. Boa noite, meu bem.